quinta-feira, 19 de abril de 2018

Entrevista com Mujica: "vivemos o império da solidão no meio da multidão"

Presidente do Uruguai entre 2010 e 2015, o senador José 'Pepe' Mujica está muito preocupado pelo que ocorre no Brasil com seu amigo Lula e o impacto disso na região
Perto de completar 83 anos (no mês que vem), dos quais passou 14 como preso político, o senador José “Pepe” Mujica, agora atua como senador, depois de ter sido ministro da Agricultura e Presidente nos anteriores governos da Frente Ampla, que governa o Uruguai desde 2005. Segue sendo uma figura fundamental na política no mundo, que observa desde a sua pequena chácara na periferia de Montevidéu, a mesma onde recebeu a equipe jornalística do Página/12.

Página/12: A Argentina está debatendo atualmente a possibilidade de aprovar um projeto de despenalização do aborto. O Uruguai o discutiu e aprovou em 2012, quando você era presidente.

José “Pepe” Mujica: Desde que o mundo é mundo há abortos. Quanto mais oculto e menos reconhecido, mais prejudicial para as mulheres pobres, que são duplamente castigadas. Para dar o passo na direção da legalização parte desta constatação, e sempre é preciso olhar a questão social, apoiar a mulher na decisão que ela tomar. Se nós deixamos isso continuar a ser um fenômeno clandestino, vamos estar alimentando uma situação inviável. (O Uruguai dá) uma atenção social e psicológica para a mulher quer interromper a gravidez. Creio que isso acaba salvando mais vidas, assim, reconhecendo esse direito, do que negando, do que dizer não ao aborto. Mas o problema continua existindo, porque somos hipócritas, se nos omitimos diante de uma sociedade de mercado que faz disso um estupendo negócio para alguns, e caro. Mas claro, as mulheres que têm a necessidade de abortar e que têm poder econômico vão resolver o problema clinicamente, bem atendidas. As mulheres que estão na base da pirâmide social vão arriscar a sua vida. Por isso nós decidimos o que decidimos. Não é uma questão de gostar ou não. No Uruguai, é uma velha forma de pensar.

Página/12: Ou seja, se trata de uma questão de realismo?

Mujica: Não se pode esconder um problema que existe. Isso nos levou a que, em 1912, houvesse um governo deu o direito ao divórcio às mulheres por sua própria vontade, sem precisar de justificativas, e que reconheceu a prostituição como um trabalho registrado. Porque eu gosto da prostituição? Não, mas porque eu sei que ela existe, é tão velha quanto o mundo. Porque não adianta um governo fingir que ela não existe que nem por isso ela vai deixar de existir. O mesmo aconteceu com as bebidas alcoólicas. Em 1915, houve um governo aqui que não pensou em Lei Seca, como nos Estados Unidos. Não: nacionalizou a produção de álcool, para garantir que fosse de boa qualidade. Daí tirava recursos para atender a saúde pública, entre eles as consequências do alcoolismo. Essa filosofia sempre esteve presente no Uruguai. Não podemos negar a evidência da realidade, e sim tentar organizá-la o melhor possível. Eu me considero um humilde herdeiro dessa tradição. A maconha é uma maravilha? Não, é um problema, eu creio que nenhum vício é bom. Se podemos legalizar, pelo menos teremos um elemento de controle e damos um golpe no narcotráfico pelo lado de quebrar o mercado ilegal. Há uma certa situação de causa e efeito: não negar a evidência da realidade e aceita-la, sabemos que se deve organizar o melhor possível para que isso funcione corretamente.

Página/12: O Brasil está vivendo um dos terremotos políticos mais importante da região nos últimos anos. Que impacto você acredita que pode ter na democracia brasileira e sul-americana o possível cenário de que um candidato como Lula seja proibido de concorrer, sendo o claro favorito nestas eleições?

Mujica: Não sei se posso medir o atual contexto, mas não é a primeira vez que o Brasil aparece delineando o terror. Basta recordar o suicídio de Getúlio Vargas. Curiosamente, deve ser o povo mais alegre da América Latina, um povo de samba, belo, mestiço. Se acontecesse na Argentina o que fizeram com um líder como o Lula haveria um terremoto social. Virariam Buenos Aires do avesso. Isso pelas tradições que o povo argentino tem. O Brasil não é assim, é diferente, não tem essa tradição de lutas coletivas, de massas, de múltiplas organizações sociais que se movem. Em que isso vai desembocar? Não sei. Porque já fizeram tantas barbaridades, recordemos o que fizeram com a Dilma. E não parece que vão parar por aí. De qualquer forma, não vai ser fácil. Parte da opinião a favor de Lula é a consequência sociológica das reformas conservadoras que estão fazendo. Colocaram o Lula em cana, mas os efeitos das reformas conservadoras são sentidos pelo povo. E o povo expressa politicamente. O PT, quando o Lula caiu, já estava destroçado. E o PT sem o Lula é muito pouco, mas com o Lula é muito, porque é um símbolo que está no núcleo da resistência.

Página/12: Qual é o seu pensamento a respeito do tema da corrupção?

Mujica: O fenómeno da corrupção golpeia toda a América latina, mas existe no mundo inteiro. Mas é uma coisa curiosa, porque na América Latina nós jogamos contra nós mesmos. Entre outras coisas, quebramos todas as nossas empresas. A Volkswagen, a maior empresa de fabricação de carros do mundo, cometeu um erro sideral, e não tem ninguém na cadeia, e continua fabricando carros. Pagou as multas. A banca Morgan foi resgatada com uma grana alta, 3 bilhões, 4 bilhões de dólares de multa. Pagaram e ficou tudo certo. E assim sucessivamente. Nós destroçamos tudo, inclusive a empresa (e quem diz isso sou eu, que tenho uma visão socializante), como a de construção social. Se as poucas que temos nós estamos destruindo, quem estamos favorecendo? As multinacionais. Eu prefiro não matar a empresa, porque a empresa é um esforço coletivo, e uma acumulação de conhecimento, de experiência, de funcionamento, isso é uma loucura.

Página/12: Este fenômeno da corrupção é interessante, porque atravessa a esquerda e a direita por igual, e hoje parece ser uma preocupação de toda a sociedade. Sob o risco de parecer ingênuo, você se arrisca a dar uma fórmula de como se combate a corrupção?

Mujica: Está se cultivando a ideia de que vencer na vida é ter dinheiro, estamos vendendo isso como um modelo, de que o triunfador é aquele que tem muita grana, e a partir desse princípio, como vamos nos assustar com a corrupção? É uma consequência do modelo que estamos plantando! E em todas as classes sociais. E o guri que nasce na pobreza e sai da favela sofre dessa mesma doença ideológica. E o burocrata que tem um cargo importante no Estado sofre dessa mesma doença ideológica. É uma consequência dessa cultura, não há porque se assustar. Então, colhemos o que plantamos. Agora, não se trata de cultivar uma sociedade de santos, e sim de se preocupar por uma sociedade solidária. Tampouco deixar que seja uma sociedade do “você faz o teu e com isso vai ser mais feliz”. É um problema de filosofia de vida.

Página/12: Qual seria essa filosofia?

Mujica: O capitalismo precisa todos estejamos sempre ambicionando, querendo, comprando coisas novas e desejando. Gerar desejos. Paralelamente, temos que fazer esta pergunta: por que há tantos psiquiatras? Por que tanta doença da cabeça? Parece que entramos no século das doenças dos neurônios, o que mostra que algo está muito errado. “Pobre é aquele que precisa de muito”, é a velha definição de Sêneca. Ou a definição dos aymaras: “pobre é o que não tem comunidade, condenado a estar cercado de solidão”. Este ideal de vida significa que comprar mais do que precisa, e que o sucesso depende da riqueza, é uma prisão que não tem fim, e que deixa muita gente pelo caminho. Para mudar isso precisamos cultivar os afetos, e isso requer tempo.

Página/12: Por que você fala cada vez mais sobre o tempo?

Mujica: As relações pessoais requerem tempo. Os afetos, porque o ser humano é muito emotivo, primeiro sentimos, depois pensamos. E os afetos requerem tempo. Mas se o tempo da nossa vida se gasta na luta por ter dinheiro, para pagar as dívidas que temos, que tempo temos para os nossos afetos? Aí você ouve dizer: “eu não quero que meu filho passe necessidade”. Mas aí vai faltar você, que jamais tem tempo para o seu filho! E você acha que vai substituir os afetos com brinquedos? As coisas não são assim. Porque as coisas inertes não emocionam. As emoções são consequência das cosas vivas. Isso é tão elementar que, tacitamente, todo o sistema nos leva por um caminho que é muito contrário ao nosso sentir. Na verdade, quando você compra, não está comprando com dinheiro. Está comprando com o tempo da sua vida que tivesse que gastar para ter esse dinheiro. Veja, eu não faço apologia da pindaíba. Toda coisa viva tem necessidades materiais e se você tem necessidades materiais tem que trabalhar para enfrenta-las, e o que não trabalha está vivendo do suor de alguém que trabalha. Mas a vida não é só trabalhar. Aqui há um conceito de limite que nos faz perder esta civilização. Há um tempo para trabalhar. Mas a vida não se faz só para trabalhar. A vida tem sentido para ser vivida, porque é a única coisa que realmente temos. Gasto tempo para ter grana para comprar. Mas não posso ir ao supermercado e comprar tempo de vida. Mas isso é o conceito de limite, o velho conceito grego de “nada deve ser demais” é uma forma de defender a liberdade. Porque, quando você é livre? Quando está submetido à lei da necessidade você não é livre. É livre quando tem tempo e o utiliza naquilo que você quer, no que gosta, no que te motiva.

Página/12: Quer dizer que a cultura do consumismo foi o que devastou os valores sociais?

Mujica: Claro! A cultura consumista golpeia todos os dias o seio dos nossos lares, de manhã, de tarde e de noite, estamos praticamente submersos. E isso é funcional ao sistema. O sistema necessita que estejamos devendo, que tenhamos quotas para pagar. E necessita que andemos desesperados por não poder comprar tudo o que precisamos, porque somos agentes do mercado. E os economistas agarram suas cabeças se o mercado interno não cresce. Mas isso é como uma onda, a direita tampouco sabe como explorar isso. Depois vem o refluxo, é inevitável. Creio que é um movimento pendular, e se tivesse que esquematizar, há tempos que parece que são mais de acumulação, e tempos onde a prioridade é o compartilhamento: nenhum desses momentos é definitivo, nem eterno. O grande problema que nós latino-americanos temos é que, por chegar tarde na festa do capitalismo, temos as veias abertas. Ou seja, boa parte dos nossos períodos de eventual prosperidade nós perdemos porque necessitamos recorrer ao investimento direto estrangeiro, depois temos que pagar a amortização e a ganância, além dos desequilíbrios que podem nos afetar. Temos pouca capacidade de gerar economia com o esforço próprio, porque estamos aprisionados pela nossa própria cultura e essa cultura nos faz também, como países, eternamente demandantes. Sem percebermos, queremos viver como o primeiro mundo, vivemos admirando o consumo do primeiro mundo, mas não somos primeiro mundo. Porque eles acumularam muito saqueando a África, saqueando a Índia. Há uma história de 200 anos atrás de nós, estivemos sempre aí, no pelotão dos saqueados.

Página/12: Há uma crise no processo de sucessão dos líderes mais fortes?

Mujica: Os homens transcendentes são muito importantes, mas não podem substituir o poder das formações políticas. É preciso ter a humildade estratégica de reconhecer que nós passamos, que a luta é eterna e permanente, e que no fundo é para melhorar a civilização humana, não só por uma quota de poder, entender que temos que contribuir para fazer girar a roda da história, e que depois são os coletivos que continuarão a fazer o que nós fizemos antes. O melhor dirigente não é aquele que faz mais, ou o que grita mais forte, ou o que tem o cartaz mais chamativo, ou mais palanque, ou mais aplausos, nada disso. O melhor dirigente é o que produz uma turma que, ao substitui-lo, está em vantagem em comparação com ele mesmo quando começou. Porque a nossa vida vai acabar, mas as causas continuam vigentes, e ainda há muito pelo que lutar. Porque a luta não é sequer conjuntural, a luta é o caminho eterno da vida.

Página/12: Isso em caso de triunfo ou em caso de fracasso?

Mujica: Nunca há um triunfo total, porque tampouco existe uma derrota total. Porque antropologicamente somos gregários. Sozinhos somos insignificantes, por mais poderosos que pareça que somos. Temos que pensar um pouco nas consequências de sermos gregário. A construção da civilização humana é a herança mais importante que recebemos quando nascemos. Desde aqueles que descobriram o fogo e a roda, até os que descobriram a biologia molecular. Quando nascemos, recebemos, sem perceber, a herança desse formidável esforço intergeracional. Quer dizer que o que se acumulou é a destilação de gerações e gerações, até chegar na nossa, e isso é construção coletiva. Isso joga contra o indivíduo? Não, é o que ampara o indivíduo. O coletivo é o único que permite que o indivíduo não esteja só e possa enfrentar a vida com outras possibilidades. No direito antigo, nas tradições antigas, depois da pena de morte, a pena mais rigorosa era que te expulsassem da comunidade, porque você tinha que sair e viver num mundo feroz, sem apoio coletivo. Nesta etapa atual da civilização, o que se tenta fazer é atomizar as pessoas, individualiza-las. Vivemos na megalópole, às vezes num bloco de apartamentos, onde sequer dizemos “oi” aos nossos vizinhos. É o império da solidão no meio da multidão. Porque quanto mais sozinhos estamos, mais manipuláveis somos. A gente tende a acreditar na ideia de que conseguimos isso ou aquilo pelo esforço pessoal... Não quer dizer que esse esforço não tenha importância, claro que tem, mas só tem porque faz parte de um cosmos coletivo que o rodeia e o impulsa. Eu posso fazer muito bem o que faço, mas quando tiver um ataque cardíaco vou precisar de um cardiologista que me socorra, e isso quem me dá é a sociedade. Se saio com o fusca e o motor morre, precisarei de um mecânico que o atenda. E em muitas outras coisas que faço preciso dos meus amigos, não faço sozinho. Tudo isso é a sociedade. Não poderíamos viver sem isso. Entretanto, parece que nos esquecemos disso. É tão elementar que queima os nossos olhos. Por isso temos que construir projetos coletivos. Mas também há outra coisa: mudar o mundo não é brincadeira, e às vezes custa caro, e não falo de dinheiro. E como uma avenida onde os carros passam, vão e voltam, e não se pode evitar que eles passem, mas temos que cruzar a avenida sem deixar que eles nos atropelem. A avenida é a vida. O cruzamento é o grau de independência que temos aqui. Se temos consciência, a luta é para que esta sociedade exigente não nos submeta. Porque creio, e este é um problema que a esquerda (ou isso que chamamos de esquerda, ou progressismo, ou do nome que se queira usar) tem que incorporar: não basta com buscar o desenvolvimento econômico, é preciso se preocupar com a felicidade humana, porque esta vida não dura para sempre.  

Página/12: Em 2016, você disse que “se a esquerda está perdendo terreno, deve aprender com essa perda”. Qual você acha que são as “lições” que a esquerda tem que aprender e colocar em prática no processo político atual?

Mujica: O duelo entre direita e esquerda compõe a história humana, é um ir e vir constante. A forma que toma é contemporânea, mas esse duelo é a cara eterna da humanidade. Triunfar na vida não é chegar a um objetivo. Triunfar na vida é se levantar e começar de novo cada vez que seja necessário. Então, se a luta é contínua, tem que ser coletiva, porque só o coletivo pode ser herdado. Além do mais, os erros e a falta de humildade, o pensar que temos a verdade absoluta revelada e que somos absolutamente imprescindíveis nos leva a perder a capacidade de negociação entre nós mesmos. As pessoas de esquerda tendem a se dividir por ideias e as de direita tendem a se unir por interesses. As de esquerda são poéticas demais, as outras são mais realistas e imediatistas. Para enfrentar isso, é preciso que haja união em coletivos grandes. Para se reunir em coletivos grandes, temos que aprender a lidar com as diferenças e chegar a pontos em comum. Mas somos frequentemente tão soberbos intelectualmente que deixamos pelo caminho tudo o que disseram, e queremos as coisas mastigadinhas e perfeitas, que só existem nas nossas cabeças. A vida não é assim. Perdemos muito das nossas energias para enfrentar os desafios impostos pela unidade da direita (embora esta também tenha suas contradições). Creio que isso tem sido um constante.

Página/12: Há um conceito que você costuma repetir, de que “é preciso defender uma república baseada com a ideia de que os seres humanos são iguais, pelo menos perante a lei”.

Mujica: Todos sabemos que alguns são muito mais iguais que outros. Quem tem muita grana tem advogados muito melhores, e esse é só um exemplo. Mas é uma afirmação de princípios que devemos defender. Devia ser um caminho ideal pelo qual lutar. Apesar dos defeitos que esse sistema mostra, não quer dizer que tenhamos que voltar ao absolutismo. Mas creio que aqueles que lutamos pelo lado da esquerda, ou que temos sentimentos solidários, não devemos nos desligar nunca da nossa forma de viver, e viver como vive a maioria do nosso povo, e não como vive a minoria privilegiada.

Página/12: Como seria isso na prática?

Mujica: A esquerda tem que cultivar uma conduta. Às vezes temos que frequentar a missa que os senhores nos convidam para sentar e falar sobre os seus interesses, mas temos que não deixar de lado a consciência de que essa não é a nossa mesa. Nossa mesa é a mesa comum, do povo comum. Temos que viver como pensamos, porque caso o contrário terminamos pensando como vivemos. A esquerda do futuro deve defender isso, e deve se preocupar disso. Eu não posso mudar a realidade de muita gente que está muito ferrada, e se não posso fazer, tenho que viver na linha em que vive a maioria das pessoas na minha sociedade. Porque isso é a República, essa coisa do republicanismo. Então, eu digo que os que gostam muito da grana não devem estar na política. Na política devem estar gente simples, sóbria. Não quero usar nunca mais a palavra austeridade, porque é mal aplicada, serve para defender políticas que deixar o povo sem emprego, é isso que chamam de austeridade hoje em dia. Frequentemente se perde essa fronteira. Quando você é um modelo, não pode cometer esses erros porque o homem da rua vê essas coisas. E se perdemos a confiança daqueles que defendemos, somos uns impostores. Não creio que temos que ser monges e fazer voto de pobreza, não é isso, basta viver como a maioria da sociedade, como a imensa maioria. E ser coerente com um discurso visando igualdade, a distribuição, a equidade e a ideia de que não se pode solucionar todos os problemas, mas que é preciso ao menos tentar. Eu acho que, frequentemente, a esquerda na América Latina se equivocou nesse caminho. Se deixou levar um pouco pelos tapetes vermelhos, por ser convidada de honra dos grandes círculos, e terminou aceitando uma série de instituições que se assemelham ao feudalismo, infiltradas dentro dos governos para criar armadilhas. Sou um velho desconfiado. Naquela época do Nikita Khrushchov, eu fui à União Soviética e me levaram a um hotel. Havia tapetes vermelhos que faziam cócegas nos meus tornozelos. Então eu perguntei: “para que fizeram este hotel, com este luxo, numa revolução proletária?”. Não gostei, e comecei a observar, até perceber que começava a se criar uma classe acomodada. Pensa bem: a forma de viver também tem a ver com o que você pensa. E também tem a ver com o conceito que se tem de liberdade: se você anda pela vida com uma bagagem leve, terá que se preocupar menos com as coisas materiais. Mas se tudo é complicado e difícil, muitos empregados, servos, muitas coisas que ficar de olho porque não pode deixar que te roubem em casa... Esquece isso, é possível viver tranquilo com muito menos. A sobriedade e a simplicidade, no fundo, são a melhor forma de ter comodidade.

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