terça-feira, 27 de junho de 2017

Liberdade de imprensa versus os crimes de difamação e injúria

Por Wilson Sousa*

Os crimes de difamação e injúria estão descritos nos artigos 139 e 140 do Código Penal Brasileiro, e possuem, respectivamente, os seguintes elementos caracterizadores: a) imputação de fato determinado que, embora sem se revestir de caráter criminoso, é ofensivo à reputação da pessoa a quem se atribui (honra objetiva); b) imputação de ofensa/insulto à pessoa determinada, capaz de ferir sua dignidade ou decoro (honra subjetiva).
Nos crimes acima citados, é fundamental uma condição especial por parte do autor em cometê-los. Dentro dessa tônica, para a configuração dos referidos crimes, o sujeito deve ter a intenção de macular ou ofender a honra alheia. Ausente um destes requisitos, a conduta será atípica.
O direito de informação jornalística é formado por uma estrutura que envolve a notícia, a crítica e os direitos de informar e ser informado. Nesse sentido, explana o juiz José Augusto Nardy Marzagão, da 4ª Vara Cível da Comarca de Atibaia São Paulo “A liberdade de informação e direito de crítica não comportam exclusão do
uso do humor, ironias ou irreverências, do contrário, não teríamos plena liberdade de expressão e opinião, como assegurado constitucionalmente”.
Nessa esteira, ressalta o Supremo Tribunal Federal na ADPF 130/DF, que a adoção da Declaração de Chapultepec em 11/03/1994, pela Conferência Hemisférica sobre liberdade de expressão consolidou, a valiosíssima Carta de Princípios fundada em postulados que, por essenciais ao regime democrático, devem constituir objeto de permanente observância e respeito por parte do Estado e de suas autoridades e agentes, inclusive por magistrados e tribunais judiciários.
A Declaração de Chapultepec ao enfatizar que uma imprensa livre é condição fundamental para que as sociedades resolvam seus conflitos, promovam o bem-estar e protejam sua liberdade, propugna por não existir nenhuma lei ou ato de poder que restrinja a liberdade de expressão ou de imprensa, seja qual for o meio de comunicação, reconhecendo assim, seu papel fundamental para manutenção do cerne da democracia.
A referida declaração se tornou um compromisso formal do Brasil em 9 de agosto de 1996, quando o então presidente Fernando Henrique Cardoso a assinou. "Quando a imprensa perde a liberdade, é sintoma de que o povo também perdeu, o que é mais grave", comentou FHC à época.
Outrossim, segundo o STF, o exercício concreto, da liberdade de imprensa e expressão, cujo fundamento reside no próprio texto da Constituição da República, assegura ao jornalista, o direito de expender crítica, ainda que desfavorável e em tom contundente, contra quaisquer pessoas ou autoridades.
Desta forma, percebe-se que uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão estatal ao pensamento, ainda mais quando a crítica, por mais dura que seja revele-se inspirada pelo interesse coletivo e decorra da prática legítima de uma liberdade pública de extração eminentemente constitucional.
Nesta senda, não se pode desconhecer que a liberdade de imprensa, enquanto projeção da liberdade de manifestação de pensamento e de comunicação, reveste-se de conteúdo abrangente, por compreender, dentre outras prerrogativas relevantes que lhe são inerentes, (a) o direito de informar, (b) o direito de buscar a informação, (c) o direito de opinar e (d) o direito de criticar.
A crítica que os meios de comunicação social dirigem às pessoas públicas, por mais acerba, dura e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos de personalidade. Além disso, o direito em análise encontra suporte legitimador no pluralismo político, que representa um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, consoante o artigo 1° da Constituição Federal.
Nesse contexto, a crítica jornalista traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer atividade de interesse da coletividade em geral, pois o interesse social, que legitima o direito de criticar, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar as figuras públicas, independentemente de ostentarem qualquer grau de autoridade.
E, por fim, é importante destacar que ninguém deve ter a seu dispor o recurso ao arbítrio, mediante a utilização de tipos penais, que possibilitam utilizar-se demasiadamente o autoritarismo para punir jornalistas que publicam matérias que contrariam os seus interesses, tolhendo e restringindo esse direito fundamental, ferindo a Carta Magna da República.

*Advogado Especialista em Direito Constitucional e Direito Eleitoral

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